terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Um caso verídico


Há muito se preparavam todas as senhoras do lugar. Era uma ocasião importante; sem exageros de quem conta, a festa mais esperada até pelos padres da Região do Baixo Parnaíba. Nesta ocasião, faziam-se leilões e os fazendeiros, consumidos de fé na padroeira, ofertavam a joia arrematada a um bom preço em favor da igreja novamente. Ora, em tempos assim, os maridos queriam ver as esposas bem vestidas e para tanto, abriam o bolso nas lojas.
O certo é que pelos dias da festa da santa padroeira, o Senhor Roberto foi com Dona Marisa à cidade. Era um senhor de bons sentimentos, embora não fosse dado a arroubos de paixão. Mas uma de suas qualidades era não medir esforços pela felicidade da esposa. Esta costumava seguir a  risco a moda, coisa rara para uma mulher do campo. E era época da mini-saia.
Não quero prender a atenção do leitor, com o enfeite de um conto erótico, assumindo o papel de uma mulher que escreve num estilo de deleite ao corpo. Apenas narro um caso sucedido com a dita senhora, sem aumentar um ponto.
_Deixe-me ir, marido! Ou não confia mais mim? De que modo posso comprar meu vestido novo?
E no entusiasmo de mostrar que não era corno:
_Pois vá, querida! Eu te aguardo na casa do padre. Vou saber da hora que ele vai benzer os cavalos antes da procissão da santa.
A mulher ficou na ponta dos pés e deu-lhe um beijo no rosto. Segui-a com um olhar por cima do aro dos óculos e arrastou as pupilas de uma lado a outro observando a ação dos homens na calçada. A saia de Dona Marisa na metade das pernas, tinha o ritmo dos passos, ondulando as formas tão claramente, que justo na porta da loja de tecidos parou um homem a olhá-la tão descaradamente; e seu Roberto teve a impressão de a mulher ter gostado. Exibida, pensou. Quis chegar mais perto, fingir que tinha esquecido de recomendar alguma coisa. Surpreso, viu-se dobrar a esquina com medo de a mulher se zangar ante um acesso de ciúmes em público.
Suspirou assim que se viu longe do marido. Por que ele a curiava assim, estupidamente, sem nunca se decidir pela separação? Bem que tinha pedido na última conversa da família dela. O marido não tinha cheiro de paixão, dissera. Não provocava nela um arrepio e, nas raras vezes que dormiam juntos, faziam sexo maquinalmente. Queria algo mais. Não podia explicar a ele.
O olhar ganhou um brilho excepcional, ao visualizar o Armazém Nova América. Dona Marisa  desfilava na rua naturalmente, habituada a caminhar no salto, mesmo na fazenda , e tomou logo a  entrada da loja seguida de Seu Joaquim.
_Que ventos a trazem, Dona Marisa? Perguntou ele.
A dama não respondeu. O sorriso iluminou-lhe as faces deixando-as ainda mais rosadas (naquele dia, estava usando um batom vermelho que deu-me a vontade de ter coragem de usar um também; meu rosto não tinha aquela cor), coisa que o dono do armazém logo notou...
_A senhora não quer olhar as novas cores de batom?
E ela o seguiu para uma sala reservada no fundo da loja... E não foi para olhar batom; pois ele colocou uma placa de “OCUPADO” não antes de piscar um olho para um dos balconistas. Eles passaram por mim, perto do caixa, numa satisfação tão grande, que eu não tive dúvidas: foram fazer amor.  

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