quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Uma flor para a professora


Afinal, o dia amanheceu! Mas não havia muito tempo para pensar no assunto, pois a mãe do menino chamava para o café da manhã. Parecia adivinhar que ele estava muito ansioso para conhecer a professora.
Primeiro dia de aula! A alegria de rever os colegas o ia levando a uma febre de sorrisos. E o fato de correr para o jardim antes do desjejum, a mãe não podia entender.
_ O que você faz aqui, meu filho? _ perguntou.
_ Estou pegando uma flor para minha nova professora, mamãe _ disse ele _ elas adoram ganhar flores e hoje é o primeiro dia de aula.
Nunca essas suaves palavras lhe soaram mais suaves do que até então.  Tinham a beleza da manhã recebendo o sol. E ela ficou a contemplar o menino segurando as flores, de encontro ao peito, como se dissesse: “A minha professora vai ser a mais bela!”... E a mãe não teve medo de dividir o filho com a professora... Não tinha não

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Lembrança


É bom lembrar-me de ti, diferente de outros amores. Outro sorriso. Outras palavras. E um outro peito. Encostado a ele, quero ganhar mãos caminhando em minha pele, mansamente, descobrindo meus prazeres. Algum dia destes, eu baterei em tua porta: ”Tum, tum, tum...” E ouvirei o arrastar de teus chinelos no quarto.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Caçadas


Seu Chico é amigo de um tio-avô meu e, se me lembro bem, sempre fora de contar causos tanto houvesse ocasião.
Na penúltima sexta-feira do ano de 2010, tive de ir com minha avó visitar o citado parente, que estava com uma virose e como já tinha idade avançada, estava deixando a família preocupada. Passamos lá umas duas noites, tempo suficiente para se saber de tudo da fazenda, inclusive dos novos causos de seu Chico.
Por volta de umas 17h, ele chegou. Sentou num tamborete, perguntou a meu tio se podia acender um cigarro, e tendo sido negado, ficou calado por uns minutos assuntando de nossa conversa sobre os destinos dos parentes. Minutos após, não se conteve e puxou esta história de um primo dele.
Contou que um filho de sua irmã mais velha tinha ido caçar no meio da caatinga. Era pelo mês de novembro e só havia uns mandacarus e uns pés de ameixa sem folhas. Então, o primo resolvera ir para as bandas de um antigo riacho nos terrenos de Seu Doca Fortes.
_E num é que havia uma faveira ainda com as favas? “Pois sim senhor! Aqui deve de ter bicho de noite”, ele pensou e subiu pro alto do pé.
Assim se passaram as horas. Veio uma coruja e piou.
_O primo se assurtou e caiu de uns quatro metros de altura, se estatelando no chão! _
Minha mãe gritou; “Ai, meu Deus!” e seu Chico se endireitou na cadeira para dar um ar de quem conta algo verídico e de muito sofrimento.
_ E daí, Chico, como acharam teu primo? _ Falou ansioso o irmão de vovó.
_ O homem passou a noite lá morrendo de dor e frio e só foi encontrado ‘proque’ tinha bala na arma dele. Quando ouviu o cachorro latindo deu um tiro pro alto...
_Cachorro? Que cachorro, Chico? Tu tá aumentando a história_, comentou um dos caboclos da fazenda.
_Eu num falei que ele tinha levado o cachorro dele? Pois o ‘bichim’ passou a noite velando o dono e de manhã foi pedir ajuda. Cachorro assim é que é ‘bom de se’ ter para ‘cumpanheiro’ de caça.
Minha avó quis dizer algo, mas se conteve. Notei pelo modo de ela levantar arrumando a saia do vestido. Contudo, apenas perguntou como o homem estava e se tinha sido sério a queda.
Num tom de quem não sabe se agradou a conversa, seu Chico falou que o primo quebrara uma perna, mas que já fora atendido num hospital da capital do estado.
Depois dessa, a noite correu sem grandes causos...

Um caso de línguas


A mulher cuidava de varrer o chão da varanda. O carteiro entregava  cartões de Natal. Ela o recebeu com um sorriso feliz, com vapores nos olhos e palavras vivas de cumprimento.
A manhã inteira cuidando do portão, com medo de ser esquecida. O envelope entre as mãos ansiosas e o som dos passos na casa. Não há nuvens escuras no céu que não seja de prenúncio de chuva. E um aroma quente das rosas no jardim contíguo ao quarto.
Há um silêncio de agasalhar a alma nos gestos. Todo o corpo quer absorver o conteúdo do cartão de Natal. Uma ansiedade lhe brota no peito, flutuante e envolvente, como se deseja um carinho depois do ato de amor. Então, pousa o envelope na cama. Abre um bauzinho, com o cuidado de sempre, não diz nada e mergulha em pensamentos – “Um dia ainda aprenderei a falar inglês!”

sábado, 1 de janeiro de 2011

Gata borralheira


Na chapa do fogão à lenha, há uma de lata de óleo usada como chaleira - Usam-na diariamente. Fervem água para o café e o feijão.
Mas, às vezes, tia Maria resmunga: “Esta gata andou chafurdando o fogão ontem à noite!” e retira a cinza espalhada por todo lado.
Há um armário de madeira tão antigo que mamãe comenta ser herança de meu avô paterno, as portas não se fecham mais... E dentro dele vive mexendo essa gata que apareceu lá por casa.
_Este bicho peludo deu agora de mexer nas cinzas do fogão... _ Reclama tia Maria.
A gata, deitada embaixo da mesa da cozinha, olha pensativa. Há uma calma na cabeça sobre as patas. E os pelos macios e longos caem como cabelos por cima dos olhos.
Tia Maria debruça-se no fogão e põe mais lenha. “Esta chaleira está velha e preta de fuligem!” E continua: _E esta gata preguiçosa? Se hoje a noite ela vier mexer nas cinzas do fogão, eu a esfolo no próprio borralho!
Era uma mulher de uns cinquenta anos... Meu pai dizia que vovô Zeba a criara desde pequena, não tinha nem conhecido a mãe. E se havia algo que eu sempre tive certeza é que tia Maria não fazia mal a uma mosca...